Pacto, de todos, pela democracia é a saída para o Peru

País vizinho vive aguda crise; cientista política brasileira Renata Peixo, da Unila, avalia cenário e perspectivas


Da Secretaria de Comunicação Social da Unila | De Foz do Iguaçu (PR)

Desde 2016, quando Ollanta Humala concluiu seu mandato, o Peru vem enfrentando sucessivas trocas de presidente por impeachment e renúncias. Foram seis presidentes em seis anos.

E a crise não parece estar próxima do fim.

Quem avalia a conjuntura do país vizinho é a cientista política Renata Peixoto, professora da Universidade Federal da Integração Latino-Americana (Unila), com sede em Foz do Iguaçu (PR).

“Pela gravidade da situação”, inicia ela, “e que se alastra ao longo dos últimos anos, e pelo que está acontecendo agora, acho que seria, de fato, muito difícil a gente imaginar um passo decisivo para o fim dessa crise que não representasse eleições antecipadas, pensar uma nova Constituição para o país”.

Essa receita, no entanto, não garantiria a governabilidade, diz a pesquisadora.

“As elites políticas, os partidos políticos, os principais setores da sociedade peruana é que precisam convergir para um pacto pela democracia, pelo estado democrático de direito”, completa.

Seis presidentes em seis anos. Quadro elaborado pela Unila

O cenário dessa crise ou das crises que se sucedem no Peru, diz a docente, é composto por vários elementos político-institucionais, questões judiciais, casos de corrupção e insatisfação popular, que vão muito além das trocas de poder entre esquerda e direita.

Para Renata, explicar a dificuldade de governar o país passa pelo enfraquecimento dos partidos políticos ao longo do tempo e um desgaste do sistema partidário.

“Se observarmos a lista gigantesca de presidentes nos últimos 30 anos, não temos nenhuma força política que se torna hegemônica. Temos, o que se convenciona chamar na ciência política, volatilidade”, comenta.

A cientista lembra que a cada eleição um partido diferente chega ao poder, mas, em sua maioria, partidos construídos para atingir um objetivo de curto prazo: a presidência. “Não há um projeto de país.”

Outro problema peruano apontado pela cientista política é a grande politização da Suprema Corte e de órgãos ligados à Justiça, como o Ministério Público.

Para ela, os efeitos da Operação Lava Jato, que também chegaram ao Peru, levaram ao uso da investigação como arma política, atingindo grandes nomes da política peruana.

“Eles [os políticos denunciados] são forças eleitorais em potencial e quando se elimina as grandes forças político-partidários, quem sobra? Nas últimas três eleições, Keiko Fujimori, que é a grande representante da direita e herdeira do fujimorismo, torna-se o grande nome da oposição”, pontua.

“Fujimori continua sempre disputando o poder com algum outro nome. Ora do centro-direita, ora um pouco mais moderado. Uma fragmentação partidária, uma grande volatilidade. Qual é o partido que domina? Não tem. Quem é o grande nome? Os grandes nomes, a maior parte deles, [estão] ‘queimados’”, completa.

CONGRESSO UNICAMERAL

Na lista das forças que dificultam o exercício da presidência do país está o empoderamento do Congresso, que diferentemente do Brasil, é unicameral.

“É muito mais complexa a negociação, porque é muito mais fácil conseguir a maioria ou isolar-se porque há apenas uma câmara para poder negociar”, explica.

“Ao longo dos anos, o papel do Congresso tem sido praticamente impedir que o presidente governe e seguir fazendo seus conchavos para seguir no poder.”

O Congresso peruano, aponta a pesquisadora, articula-se muito bem com o Judiciário e, embora não esteja livre de escândalos de corrupção, ainda consegue “dar as cartas”.

POPULAÇÃO PROTESTA

Na falta de coalizão entre os poderes da República, resta à população protestar, mesmo que por motivos aparentemente conflitantes.

Para Renata Peixoto, a falta de governabilidade e de condições para o cumprimento dos mandatos, aliada à inexistência ou descontinuidade de políticas públicas são o que mais angustiam a população.

Por isso, nas ruas, a população pede por uma nova Constituição, pela dissolução e renovação do Congresso Nacional, eleições antecipadas, a instalação de uma assembleia constituinte.

“O povo quer recomeçar, parar esse período de crise e ter governos com resultados positivos para a população.”

SEM ESTABILIDADE PARA UMA NOVA CONSTITUIÇÃO

Em sua avaliação, no entanto, ainda não há uma estabilidade política suficiente para a elaboração de uma nova Constituição, como pedem os manifestantes.

“Não temos os elementos para isso. Então, esse é um momento fundacional, de refundar a política e a democracia peruanas. E, antecipar as eleições pode, sim, ser algo positivo para contornar essa crise, impedir que ela se deteriore”, assinala.


Imagem em destaque: Palácio do Governo do Peru. Foto: divulgação / Presidência da República do Peru




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