Famílias mais empresas gastam quase R$ 500 bilhões por ano com juros; isso sem contar nos mais de R$ 300 bilhões de orçamento público destinados ao sistema financeiro
Por Gabriel Valery, da Rede Brasil Atual | De São Paulo
O clichê diz que a população brasileira trabalha para pagar imposto, mas os fatos mostram que o que suga mesmo o povo é o sistema financeiro.
Além dos mais de R$ 300 bilhões que o orçamento da União deste ano destina ao pagamento de juros da dívida, uma fortuna vai diretamente da renda das famílias e das empresas para os bancos – pagamento de juros de dívidas de empréstimos, cartão de crédito e cheque especial.
Em 2017, a população brasileira gastou R$ 354,8 bilhões com juros, segundo levantamento divulgado nesta semana (dia 25) pela Federação do Comércio de Bens, Serviços e Turismo do Estado de São Paulo (Fecomercio).
Quando se incluem os gastos das empresas, a despesa com juros chegou a R$ 475,6 bilhões no ano passado, alta de 11,8%.
Mesmo com as sucessivas reduções na Selic, a taxa básica da economia, os juros reais se mantêm como um dos mais altos do mundo, o que acaba por impedir a retomada do crescimento econômico.
Para a presidenta da Confederação Nacional dos Trabalhadores do Ramo Financeiro (Contraf-CUT), Juvandia Moreira, “são os bancos agravando a já absurda desigualdade social no Brasil”.
O aumento real (acima da inflação) da despesa com juros foi de 17,9% em relação ao ano anterior. Esse montante representa 5,4% do Produto Interno Bruto (PIB) e 10,8% da renda anual das famílias. O valor supera gastos com educação no país, que giram em torno de 4,9% do PIB.
O fato de os juros reais praticados pelos bancos não acompanharem a taxa básica fixada pelo Banco Central são reforçados pelo estudo. “Apesar do ciclo de reduções contínuas na taxa Selic no decorrer de 2017, os juros médios cobrados das pessoas físicas subiram 4,4%, passando de 64,9% em 2016 para 67,8%”, afirma a entidade. Atualmente, a taxas Selic está em 6,5% ao ano – ainda uma das mais altas taxas reais do mundo, de três a quatro pontos percentuais acima da inflação.
Para o supervisor do escritório regional do Dieese em São Paulo, Victor Pagani, independentemente dos cortes na Selic, a redução dos juros não chegou ao consumidor final.
“Cartão de crédito, cheque especial não tiveram redução na proporção e continuam estratosféricos, superam 200%. No estudo da Fecomercio, eles falam dos juros médios, dos juros efetivos, que são dez vezes maiores do que a Selic. O principal fator responsável é que o setor financeiro é muito concentrado. Dá para dizer que é um oligopólio”, afirma.
“Não tem concorrência de fato entre os bancos e eles estabelecem o spread bancário, que é a diferença entre os custos de captação para eles e os juros que cobram dos consumidores, de forma muito alta. Eles falam da inadimplência, mas sabemos que a falta de concorrência efetiva permite que eles coloquem os juros nesses patamares”, acrescenta Pagani.
SAÍDA É PELOS BANCOS PÚBLICOS
Entre as saídas, estaria o fortalecimento dos bancos públicos. “É uma possibilidade a utilização dos bancos públicos para estabelecer maior concorrência. Esse é um dos instrumentos que poderiam ser utilizados.”
Pagani defende alterações na condução da política econômica. “Como há um desequilíbrio fiscal no Estado, ele recorre ao mercado financeiro, criando o endividamento público e a rolagem da dívida. Para isso, emite títulos remunerados pela Selic. Com medidas de equilíbrio, teoricamente, a taxa de juros pode ser reduzida”, diz o economista.
Imagem em destaque: charge da Contraf-CUT
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