Com o golpe que destituiu um governo popular eleito, a exploração deixou de financiar o desenvolvimento nacional para ser apropriada pelos interesses do mercado
Por Rafael Tatemoto, do Brasil de Fato | De Brasília (DF)
Agora em setembro, o início da exploração dos campos que formam o pré-sal brasileiro completou uma década. Entre conquistas e retrocessos, entidades ligadas à questão do petróleo no país apontam que o potencial das reservas em induzir e garantir o desenvolvimento nacional não tem sido plenamente utilizado por conta de decisões políticas recentes.
A descoberta, em 2006, do pré-sal fez o Brasil dar um salto significativo no ranking mundial de reservas de petróleo. Ainda hoje, passados mais de 12 anos, o volume total do pré-sal é desconhecido.
O analista Cloviomar Caranine, do Departamento Intersindical de Estatística e Estudos Socioeconômicos (Dieese) e assessor da Federação Única dos Petroleiros (FUP), aponta que, além disso, os novos campos poderiam significar o barateamento dos derivados no Brasil.
“Naquele momento, em 2006, o Brasil tinha 12 bilhões de barris nas reservas. As primeiras descobertas davam uma dimensão de cerca de 50 bilhões de barris. Em 2015, a UERJ [Universidade Estadual do Rio de Janeiro] fez um estudo, e segundo eles, o pré-sal poderia ter de 176 bilhões a 270 bilhões de barris de petróleo. Não se tem ainda o tamanho exato. O petróleo do pré-sal é de melhor qualidade. Isso significa que nossas refinarias têm capacidade de produzir um derivado melhor. Além disso, tem um custo de exploração menor do que a gente já tinha no Brasil”, afirma.
BRASIL POTÊNCIA
O petroleiro Gustavo Marsaioli, diretor do Sindipetro Unificado de São Paulo, explica que a descoberta levou o país da 15ª posição para estar entre as cinco maiores potências mundiais em petróleo. E, caso a estimativa mais otimista se concretize, o Brasil estará entre as três maiores reservas. O petroleiro também observa que a produção só se tornou possível pelo alto grau de investimento em pesquisa e tecnologia da Petrobrás, já que outras empresas chegaram a declarar que as áreas em inviáveis no passado.
“Hoje, mais de metade da produção de petróleo e derivados vem do pré-sal. Do ponto de vista das reservas, nós saltamos da 15ª maior para estar entre as cinco maiores.Hoje a maior reserva do mundo é a Venezuela, mas é um petróleo pesado e um parque industrial muito pequeno. O Brasil, além de ter uma reserva muito grande, temos um um parque considerável”, sublinha.
PRODUÇÃO ATUAL
O petróleo oriundo do pré-sal é responsável por 55% dos derivados produzidos no país. Em julho, os campos produziram 1,8 milhão barris por dia.
Com um petróleo de melhor qualidade relativa e com custo de extração menor, o que explica o fato dos derivados não terem ficado mais baratos no Brasil? Para Marsaioli e Caranine, a opção, desde 2016, de equiparar o preço doméstico às variações do mercado internacional, que produz a preços mais altos.
[Essa opção passou a ser adotada depois do golpe de 2015-2016. O governo da presidenta Dilma Rousseff tinha sido eleito com o compromisso de manter uma política petroleira que preservasse a gestão dessa riqueza sob controle do poder público. E esse compromisso vinha sido mantido. Os opositores, que assumiram o governo com o golpe, eram contrários a essa política].
RETROCESSOS COM O GOLPE
O fim da política de conteúdo nacional, por exemplo – que obrigava que parte dos componentes da exploração fossem produzidos localmente, gerando emprego em renda no Brasil –, fez com que a indústria naval fosse desmontada no país.
O diretor do Sindipetro, Marsaioli, cita estudo que indica que tal política garantia que “a cada R$ 1 investido na produção petrolífera, gerava-se a circulação de R$ 9 na cadeia industrial que a cerca”.
O fim da da operação exclusiva da Petrobras no pré-sal é outro retrocesso. Os campos são leiloados sob a regra da partilha: a operadora que apresentar o maior percentual de lucro a ser divido com o Estado brasileiro ganha a licitação.
Conforme explica Caranine, do Dieese, como a Petrobras é a empresa que extrai o petróleo do pré-sal ao menor custo, por conta do conhecimento acumulado e das tecnologias desenvolvidas, é ela a que mais renda garante ao Brasil. As outras, estrangeiras, com custos maiores e lucros menores, repassam menos.
Marsaioli acrescenta que o fim da operação exclusiva retira a possibilidade do Estado brasileiro e da Petrobrás investirem, inclusive, em alternativas energéticas de longo prazo, pois parte da renda petroleira do pré-sal deve ser obrigatoriamente investida em educação, além da saúde.
“Há uma questão hoje, da tendência de migração para um economia de menos carbono. Como a gente vai gerir essa reserva de petróleo frente ao desenvolvimento de novas tecnologias? Desarticula a Petrobrás como empresa de energia e não somente uma empresa de petróleo”, aponta.
Imagem em destaque: plataforma P-58. Divulgação Petrobrás
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