Transformados em entretenimento pela televisão, debates entre candidatos viram ringue

Segundo turno das eleições municipais de 2024 será em 27 de outubro, candidaturas estarão frente à frente. Que as regras desestimulem a lacração e jogo da discórdia


Por Wagner de Alcântara Aragão, especial para a Revista Intertelas | Do Rio de Janeiro (RJ) 

A cadeirada de José Luiz Datena (PSDB) em Pablo Marçal (PRTB) entrou para os anais dos debates de televisão envolvendo candidatos a cargos eletivos. Mas, a imagem do gesto físico, concreto, foi só um detalhe diante da onda de agressões verbais, morais e éticas que tomou conta desses eventos reunindo os postulantes à Prefeitura de São Paulo, neste ano. Consequência de pelo menos dois fatos.

Um, a demonização e negação da política fomentada por décadas pela mídia hegemônica, que fertilizou o terreno para o naturalizar de pseudos outsiders. Dois, a transformação desses debates em shows, em programas de entretenimento. Este texto se debruça sobre esse segundo ponto. De pelo menos 20 anos para cá, os debates começaram a ser tratados na programação da televisão como momentos de embates (e não de debates) de oponentes.

Os debatedores e debatedoras são colocados de pé no estúdio. São obrigados a ficar o tempo todo assim, eretos e eretas, em posição de sentinela, de prontidão. Em alguns desses eventos, quando chega a hora de perguntas entre candidatos, eles são encaminhados ao centro do palco, colocados um diante do outro. Como dois lutadores de boxe.

Já de dez anos para cá, com a onipresença das redes sociais digitais em nossas vidas, esses momentos nos debates passaram a servir menos para aquele encontro em si, e mais para a geração de cortes, frases de efeitos, lacração para a internet. O objetivo, implicitamente estimulado, é “jantar”, “calar”, “humilhar” o oponente, para viralizar nas redes. As hashtags sobem, os debates aparecem nos “trend topics”. É o que importa – e não se o horário é o adequado para a maioria da população, se audiência é de fato massiva. O que está sendo dito – ou o que deveria ser dito, discutido – fica em segundo plano.

Disso aí para palavras de baixo calão, xingamentos, trocadilhos, ofensas, baixarias, jogo sujo como o que culminou com a cadeirada foi só um passo. Uma tragédia anunciada. Foi necessária uma reação extrema para nos darmos conta que esses encontros viraram jogos da discórdia de reality show, e não debate político? É evidente que debate eleitoral pressupõe divergências, momentos de estresse e tensão. Tem emoções à flor da pele, não é bate-papo de amenidades. Tudo dentro, porém, de discordâncias conceituais e de contrapontos, incoerências de trajetórias.

Os debates presenciais de 1989, os debates para o Governo de São Paulo de 1982 entre Franco Montoro e Jânio Quadro, os de 1998 entre Mário Covas e Paulo Maluf, entre outros, estão repletos de cenas de diálogos extremos. Mas todos com os debatedores sentados em suas posições, tratados como estando numa arguição mútua, não numa rinha.

Que se restabeleça o decoro, a civilidade. A televisão e sua linguagem audiovisual têm sua responsabilidade, e muito podem contribuir para a reconstrução. Porque no terreno do caos e da barbárie é onde negacionistas, reacionários, egoístas, neoliberais se criam. É quando a democracia, já frágil, corre perigo.


Imagem em destaque: o registro da cadeirada no debate entre candidatos à Prefeitura de São Paulo. Reprodução TV Cultura




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